O psiquiatra António Bento recorda que Freud disse que a saúde mental se mede pela nossa capacidade de trabalhar e amar. “Agora, mais de 100 anos depois, a maioria de nós está sem trabalhar. Mas podemos e devemos amar”, refere ao Expresso. “Falar das coisas más que poderão decorrer do isolamento social é um pouco chover no molhado: angústia, tristeza, desespero – quiçá, rutura emocional”, acrescenta, optando por falar de “algumas coisas boas para o nosso tempo de quarentena”. E destaca os livros, “sobretudo os psicolivros”, ou seja, “os clássicos daqueles bons autores que todos conhecemos e que, através do mundo ficcional, nos dão a conhecer a profundidade das relações humanas”. “A Peste”, de Albert Camus, é “justamente o mais falado” porque “à atualidade do tema junta-se a alegoria do ser humano”, descreve. A escrita é “sempre uma boa ideia” e “muita gente está a aproveitar para começar um diário de bordo da pandemia”.
“A solidariedade e o altruísmo, ao desenvolverem o que de melhor há em nós, criam um ‘sentido de vida’, uma bonita expressão de Victor Frankl”, adianta o psiquiatra. Frankl foi um neurologista austríaco e um sobrevivente do Holocausto, não sendo o único autor que António Bento destaca. O filósofo francês Emmanuel Levinas “ensinou-nos que nascemos sozinhos, morremos sozinhos e estamos condenados a viver sozinhos” e que “só o amor nos pode aproximar uns dos outros”, lembra. “’O outro é o meu mestre’ foi a sua frase principal e trago-a sempre comigo quando trato migrantes e refugiados”, indica o psiquiatra, que naturalmente não descura a importância da “ajuda especializada”.
Ana Moniz esclarece que “este modo de agir guiado pelo medo é sobretudo adaptativo”. “Mas é importante estar atento a como o medo nos dá apenas uma visão parcial da realidade, ampliando uma ameaça. Deixamos de nos preocupar com outras ameaças que não deixaram de existir”, enfatiza a psicóloga. E sugere “uma gestão eficaz do medo nesta fase”: “aquela que nos permite não ignorar a ameaça, fazer o que está ao nosso alcance para nos protegermos, mas manter uma visão crítica sobre o exagero a que o nosso medo nos pode levar”.
A especialista sinaliza ainda que daqui a algum tempo, quando a ameaça passar, “podemos assistir a um exacerbar de perturbações de ansiedade ou obsessivo-compulsivas” e “o nosso radar do perigo pode precisar de algum tempo e intervenção para deixarmos de estar constantemente em alerta”. O psiquiatra António Bento reconhece “os riscos catastróficos que a perda da pessoa amada nos pode trazer”, mas insiste que “valerá a pena arriscar porque nada existe de melhor à face da terra”. E, por isso, em tempos de quarentena e isolamento, sugere: “amem mais e melhor”.
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