Só te vi duas vezes. Apanhaste-me desprevenido. Foram os
teus olhos ou o teu sorriso. Da primeira vez não nos falámos. Vi-te só de pé.
Olhavas para longe. Da segunda disseste-me que nada fazias, que nada pretendias
fazer, que tudo seria inútil. Que gostarias de trazer um pouco de felicidade a
alguém e não sabias como nem a quem. Continuámos a beber e depois convidaste-me
para dançar por detrás de umas cortinas. O teu corpo era esguio e mexia-se para
além da tua vontade, ao som da música que nos emociona sem que saibamos porquê.
É tão bom não saber nada. Foi logo disso que gostei em ti, de nada saber de ti.
Não pretendias ser quem quer que fosse. Qualquer ambição manchar-te-ia para
sempre. Cada pessoa é um mundo que desconhecemos. É tão estranho conhecer. Aprendemos
e depois desaprendemos. Cada um uma pequena multidão. Só te vi duas vezes e foi
o bastante para agarrares o que me resta da alma e dói mais do que o prazer. De
onde vinhas? Do nada. Para onde ias? Para o nada. Somos feitos de nada, mas
entre nós e deus não há ninguém.
Pedro Paixão
– Ladrão de Fogo
O poder da Natureza é infinito, eu sou natural.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Odeio as almas estreitas, sem bálsamo e sem veneno, feitas sem nada de bondade e sem nada de maldade.Nietzsche
Deixa aqui algum bálsamo.